Comitê da ONU em defesa das mulheres incorpora recomendações da Comissão Arns sobre população feminina em situação de rua
Comitê da ONU em defesa das mulheres incorpora recomendações da Comissão Arns sobre população feminina em situação de rua
Informe do CEDAW (Comitê de Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres) determinou, na última segunda-feira (04/06), medidas que passam a ser de implementação obrigatória no Brasil
São Paulo, junho de 2024 – O Comitê Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres – CEDAW, na sigla em inglês –, ao concluir o processo de revisão do Brasil perante o órgão, divulgou hoje (3/6) relatório final com destaque para brasileiras vivendo em situação de rua. O Comitê afirma ver com preocupação o fato de que estas mulheres representem hoje cerca de 15% do total da população de rua no Brasil, “enfrentando risco agravado de violência de gênero”.
O tema foi levado ao CEDAW pela Comissão de Direitos Humanos D. Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns, em parceria com o Movimento Nacional de População de Rua, Movimento Nacional de Luta em Defesa da População em Situação de Rua e pelo Movimento Estadual da População em Situação de Rua em São Paulo, como forma de contribuição ao processo de revisão periódica do Brasil. No seu relatório final, o CEDAW cita textualmente o documento apresentado pela Comissão Arns, entendendo que a falta de programas sociais e de proteção se torna mais urgente “tendo em vista que muitas das mulheres vivendo nas ruas continuam a ser chefes de família, com a responsabilidade de cuidar de filhos e de pessoas idosas”.
Nos últimos anos, a Comissão Arns tem se voltado para a situação de extrema vulnerabilidade das pessoas que habitam as ruas de capitais e cidades de médio porte pelo país, levando em conta pesquisas que apontam um aumento de 140% desta população ao longo da pandemia. Diante da crise sanitária e do vazio de políticas públicas para o segmento, a Comissão Arns buscou dialogar, de forma emergencial, com prefeitos, governadores e demais autoridades, a fim de pelo menos tentar mitigar o estado de abandono destas pessoas.
A par disso, a Comissão Arns realizou três importantes seminários com múltiplos atores, na tentativa de desvendar uma realidade tão presente aos olhos de todos e, ao mesmo tempo, tão invisibilizada, socialmente: dois seminários aconteceram em 2023 na FGV-Direito e o maior deles na sede da Fiesp, em 7 de abril último. Neste encontro, a Fiesp atuou como parceira e anfitriã de um programa de debates de dia inteiro, com superlotação de público.
Na ocasião foi dada a palavra aos representantes dos vários movimentos PopRua, além de representantes do Ministério Público, defensores públicos, pesquisadores e ativistas sociais, em mesas temáticas sobre os desafios de quem precisa de moradia, emprego, documento, saúde, segurança, respeito e esperança.
Mulheres vivendo essa condição puderam expor a sua vulnerabilidade agravada, ecoando uma das conclusões de estudo realizado pelo IPEA: embora elas sejam entre 13% e 15% do total de pessoas vivendo nas ruas, são vítimas de cerca de 40% dos casos de violência sofridos por esta população.
O relatório elaborado pela Comissão Arns ao CEDAW mostrou como os raros levantamentos sobre a População de Rua no Brasil têm sido omissos em relação à violência de gênero, recomendando com urgência que os institutos de pesquisa, a começar pelo IBGE, e demais órgãos de governo, comecem a trabalhar com dados desmembrados por sexo e orientação sexual, para construir políticas públicas mais eficazes.
O relatório de recomendações do CEDAW, nesta mesma direção, determina que o Estado-parte Brasil “urgentemente desenvolva um plano de ação, em consulta com os movimentos dos sem-teto e da sociedade civil, na busca de uma proteção abrangente de saúde e serviços sociais para mulheres moradoras de rua, que alcance suas crianças e outros dependentes, também abordando o direito à moradia”.
A Convenção CEDAW, considerada uma carta internacional pelos direitos das mulheres, foi aprovada pela Assembleia-Geral da ONU em 1979, entrou em vigor em 1981 e foi ratificada pelo Brasil em 1984. As recomendações emitidas pelo seu Comitê, como no presente relatório, passam a fazer parte integral da própria Convenção, sendo de implementação obrigatória no Brasil, nos três poderes constituídos e nos três níveis federativos.
Sobre a Comissão Arns
Criada em fevereiro de 2019, a Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns busca dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas – como negros, indígenas, quilombolas, pessoas LGBTQIA+, mulheres, jovens, comunidades urbanas ou rurais em situação de extrema pobreza. A Comissão Arns trabalha em rede com outras organizações sociais para detectar casos, dar suporte a suas denúncias públicas, encaminhar questões aos órgãos do Judiciário e organismos internacionais, promover ações específicas junto a lideranças políticas e mobilizar a sociedade. Seu trabalho é apartidário e congrega figuras públicas de formações distintas, mas complementares, todas elas comprometidas com a defesa da dignidade da pessoa humana.
Em seu nome, a Comissão destaca a figura do Cardeal Dom Paulo Evaristo Arns (1921-2016), Arcebispo Emérito de São Paulo. Em 1972, Dom Paulo criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo, porta aberta no acolhimento das vítimas da repressão política e policial no país. Ao homenageá-lo, a Comissão reconhece esse exemplo de resistência, resiliência e, sobretudo, de esperança para os brasileiros em tempos difíceis.
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